12 de abril de 2013
A Melhor Oferta (The Best Offer, 2012), de Giuseppe Tornatore
O realizador do mítico «Cinema Paraíso» está de regresso com mais uma história de uma personagem invulgar, como a do protagonista do excelente «A Lenda de 1900». Aqui o protagonista é um leiloeiro e coleccionador de quadros, interpretado de forma magistral por Geoffrey Rush, com medo do relacionamento com mulheres. O filme coloca em paralelo o portentoso retrato da solidão afectiva de um homem e uma espécie de parábola sobre a arte, o mistério do feminino e os caminhos tortuosos do amor. Um filme com uma enorme capacidade de tocar a alma humana (pelo menos a minha tocou) e em relação ao qual não se pode esquecer o contributo da sua belíssima banda sonora do incontornável Ennio Morricone (felizmente que a sua idade não o impede de trabalhar e de continuar em forma). Destaque para três sequências memoráveis: duas envolvendo o compartimento secreto de Virgil e ainda a sequência final, que exala uma imensa tristeza. Um filme imensamente belo, que é na minha opinião um dos mais marcantes do ano.
3 de abril de 2013
00:30 - A Hora Negra (Zero Dark Thirty, 2012), de Kathryn Bigelow
Um tour de force realizado com mestria por Kathryn Bigelow que fica como documento incontornável sobre um dos processos mais intrincados do combate ao terrorismo e da História deste início de século. O que mais impressiona, de facto, é a forma como "Zero Dark Thirty" cola o espectador ao ecrã e o faz esquecer de que está a ver um filme e não a assistir a fragmentos da realidade tal como ela aconteceu. Não que estejamos num registo de docudrama clássico, antes porque a secura de processos, a escolha dos planos e a recusa de invocações psicológicas para as acções das personagens conduzam por vezes a um estilo próximo do cinéma-verité. Temos, pois, um relato vibrante que consegue colocar no seu centro uma mulher (o termo motherfucker com que a dada altura se auto-intitula não é inocente) que, numa paisagem dominada por homens, consegue ser a mais forte, sem, contudo, perder a vulnerabilidade tipicamente feminina. Uma grande personagem feminina (filmada, não por acaso, por uma mulher). Um grande filme.
1 de abril de 2013
Terra Prometida (Promised Land, 2012), de Gus Van Sant
Chaplin disse um dia que a vida é uma comédia quando vista à distância e uma tragédia quando analisada de perto. O novo filme de Gus Van Sant tem a ver com isto. Aquilo que no fundo é um processo quotidiano do capitalismo vigente - uma empresa a trabalhar com vista à obtenção de lucros milionários - vai-se lentamente transformando numa crítica a uma sociedade que prefere entreter-se com o plano geral em vez de procurar resolver os dramas do grande plano. Esta transformação actua em simultâneo com a transformação do seu admirável protagonista (Matt Damon, co-autor do argumento), que finalmente percebe que é mais uma marioneta de uma engrenagem que o transcende. O filme encena esta problemática com uma apurada delicadeza para com as pessoas e delicia-nos com o seu fino sentido de humor. Em tempos de convulsão económica, este é um filme muito actual, pois coloca a questão central: que sentido tem a acumulação de riqueza se esta não estiver ao serviço do planeta e, por inerência, das pessoas? Pois é, todos temos um preço. Esse continua a ser o problema.
19 de março de 2013
Ferrugem e Osso (De Rouille et d'os, 2012), de Jacques audiard
Um filme poderoso, que mistura nas doses certas os ingredientes do melodrama, preservando um realismo muito contemporâneo. Organizado à volta de duas grandes interpretações, o filme consegue colocar em cena algumas das características mais arreigadas da masculinidade e da feminilidade, através de personagens que podiam fazer parte do nosso mundo, e por isso são tão verosímeis. Excelente a forma como fotografia, montagem, banda sonora e efeitos especiais (sim, daqueles em que não se pensa neles) se ligam de forma harmoniosa, fruto do talento de Jacques Audiard. Inesperado, tocante, por vezes enervante, sedutor, acutilante, terno, ousado. Emocionante, portanto.
10 de março de 2013
Efeitos Secundários (Side Effects, 2013), de Steven Soderbergh
Um thriller muito eficiente, por um dos mais eclécticos cineastas da actualidade. Embora em muitos aspectos se aproxime de uma das suas obras mais recentes («Contágio»), o filme de que mais me recordei foi o seminal «Sexo, Mentiras e Vídeo». Pelo sexo e pelas mentiras, claro, mas também por uma ambiência muito própria, que lhe dá o aspecto de filme independente, mesmo sendo uma produção mais comercial (marca de Soderbergh, que praticamente só não se faz sentir na série «Ocean`s»). É nitidamente um filme-prozac, já que se sai francamente bem-disposto pela degustação fílmica. Com a vantagem de não provocar efeitos secundários. E Rooney Mara, depois do excelente papel em «Millenium 1», continua excelente.
6 de março de 2013
O Substituto (Detachment, 2011), de Tony Kaye
Filme desencantado e fortíssimo, de visionamento obrigatório para professores e para alunos adolescentes. Uma espécie de anti-"Clube dos Poetas Mortos", dilacerada visão do papel da escola, dos professores e da sociedade. Para além da magnífica interpretação de Adrien Brody, o que mais impressiona no filme é a forma como retrata as angústias das suas personagens e como, apesar do negrume, revela que é sempre possível fazer a diferença se nos interessarmos. O problema é a enorme dificuldade de, por vezes, nos interessarmos.
Eu, que já fui professor, revi-me de forma emocionada em muitas sequências e comprovei que se trata de uma das mais difíceis profissões dos nossos tempos (muitos professores são autênticos super-heróis). E aquela sequência em que um professor chega a casa, constata a sua invisibilidade, e a primeira coisa que vê no teste que se prepara para corrigir é um insulto dá vontade de chorar, muito.
2 de março de 2013
O Mentor (The Master, 2012), de Paul Thomas Anderson
Um filme difícil, mas repleto de ingredientes de excelência. Ambivalência é, pois, a palavra que me ocorre. Uma realização longe da espuma dos dias, uma reconstituição de época que não procura exibir os valores de produção, um trabalho notável com os actores, um ritmo que não galvaniza o espectador. PT Anderson mantém-se como figura ímpar na produção de Hollywood e um dos seus "autores" a ter sempre em conta. Mas é, acima de tudo, o brilhantismo da personagem do discípulo o que mais impressiona, numa interpretação do outro mundo de Joaquin Phoenix. Isso, sim, fica na história.
18 de fevereiro de 2013
O Impossível (The Impossible, 2012), de Juan Antonio Bayona
A estrutura não vai, de facto, muito além da de um telefilme, mas acaba por valer a pena o visionamento pelos actores, pela excelente reconstituição do tenebroso desastre natural e porque, afinal, faz parte da natureza humana emocionarmo-nos com uma família que, após a desintegração, se consegue reunir (quem tem filhos, então, vai precisar de mais lenços).
15 de fevereiro de 2013
Bestas do Sul Selvagem (Beasts of the Southern Wild, 2012), de Benh Zeitlin
Um daqueles filmes que surgem das margens às grandes produções e acabam por obter um reconhecimento bem merecido. Primeiro, é uma história que agarra o espectador, ou seja, uma eloquente ilustração da força do cinema narrativo. Depois, temos o prazer de assistir ao domínio da criatividade sobre os meios de produção, já que, neste caso, isso significa também a vitória do ser sobre o ter. A pequena protagonista é, certamente, fabulosa (embora seja duvidosa a nomeação para o Óscar), e o mais que se pode dizer é que sabe mesmo bem fruir de um filme cujo exotismo serve para confirmar uma verdade humana essencial. Qual? A de que todos encerramos uma história única, que resulta da imbricação de duas dimensões: a real e a imaginária. E há uma sequência magnífica, perto do final, que envolve um alcouce de luzes multicolores e pedaços de jacaré panado...
8 de fevereiro de 2013
Mata-os Suavemente (Killing them Softly, 2012), de Andrew Dominik
Confesso-me desconcertado. Por um lado, enalteço a forma como o filme se desalinha dos filmes de gangsters industriais e se assume como um "filme de autor", proporcionando a muito referida lentidão (que passa pelo domínio dos diálogos sobre a acção) que já marcara a obra anterior do realizador e que é responsável pelo estilo do filme. Por outro, estou em crer que falta aqui uma real sedução do espectador e que o subtil paralelismo com a actualidade económica acaba por falhar os seus intentos. Ainda assim, há cenas excelentes, como a da morte da personagem do fantástico Ray Liotta. Mas o sabor final demonstra que a brandura de processos origina a brandura de resultados. E dá ainda mais vontade de rever «Goodfellas» ou «Casino».
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