4 de maio de 2006

«A Criança» («L’Enfant», 2005), de Luc e Jean-Pierre Dardenne


Emotivo exemplo do realismo contemporâneo (neo-realismo ou o que lhe quisermos chamar), este é um belo filme representativo de um cinema sem artifícios, directo, que conta uma história tão próxima de nós que quase a podemos tocar. Não há modificações em relação ao estilo dos irmãos belgas (veja-se o caso da outra Palma de Ouro, «Rosetta»), sem concessões, que jogam tudo no efeito de verdade que conseguem retirar dos seus actores, perseguindo-os implacavelmente de câmara ao ombro, perscrutando-os em grandes planos, acompanhando-os nas suas deambulações.
Neste caso, temos um pequeno delinquente, Bruno, que se vê a braços com um filho para o qual não está preparado. A sua falta de responsabilidade e de maturidade fazem com que coloque o bebé no centro dos seus esquemas para ganhar dinheiro sem trabalhar, mas a namorada, Sonia, não é da mesma estirpe e entra em colapso com a perda do bebé. Mas a redenção é possível…
Para além de sermos tocados por aqueles seres algo marginais, ainda em crescimento, mas inicialmente felizes, impressiona a forma como nos interessamos pelas suas opções, atitudes e trajectos, num percurso que quase se transforma num filme de suspense. É uma história de amor entre dois jovens (excelentes as sequências carnais sem sexo que quase tiram o fôlego ao casal), um retrato da realidade suburbana europeia das margens, uma ilustração do poderoso instinto materno (e da paternidade indiferente?)… Enfim, um conto da contemporaneidade onde não faltam os sinais do progresso (o uso do telemóvel é central) nem as características humanas que permanecem. Só não se percebe porque estreia quase um ano depois da consagração máxima em Cannes...

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