Mais uma lição de cinema do mestre. Prodigiosa cinematização da vida do excêntrico milionário Howard Hughes, desempenhado de forma fabulosa por Leonardo Di Caprio. Ao contrário das biografias politicamente correctas que abordam os principais acontecimentos da vida do biografado, do nascimento até à morte, «O Aviador» pega na personagem de Hughes e trabalha-a na sua essência sem se preocupar em ser abrangente ou linear. Mostra o fascínio de um homem com sonhos estratosféricos e paixões obsessivas. Dá a ver as contradições e vulnerabilidades de um génio tão humano e inspirador, sem o retirar das convulsões do seu tempo e das idiossincrasias do seu país. Combina o plano geral – a comédia involuntária que protagoniza com as suas manias e excentricidades – com o grande plano – a tragédia de um homem só com a sua vontade de transcender todos os limites. O cinema é obviamente o palco privilegiado para as façanhas humanas que ousam o alargamento de fronteiras – emocionais, afectivas, éticas ou políticas. Martin Scorsese é um artista maior desta sétima arte e aqui proporciona-nos uma maravilhosa incursão pelos sonhos e ambições mais desmedidas do ser humano. A sua genial realização convoca o imaginário do cinema e presenteia-nos com reminiscências de «Citizen Kane», «Tucker» ou «Larry Flynt», acrescentando à história dos filmes (mais) um retrato ímpar de um verdadeiro herói.
E se a perfeição técnica já não admira nas obras de Marty (grande montagem, fotografia e direcção artística…), vale a pena realçar a magnífica interpretação de Leonardo Di Caprio (quem anda distraído ainda é capaz de falar na sua bonita cara) e a estupenda galeria de secundários, com Alan Alda, Alec Baldwin, John C. Reilly e Cate Blanchett, entre outros.
Deliciemo-nos com «O Aviador», regozijemo-nos com o talento inato de Scorsese.
23 de fevereiro de 2005
11 de fevereiro de 2005
"Perto demais" (Closer, 2004), de Mike Nichols
"Closer" confronta-nos com um teatro de crueldade onde as relações humanas (sob o manto diáfano do amor) são uma espécie de guerrilha que propaga um estado de cicatrização permanente. As quatro personagens principais enredam-se na teia que vão criando à medida que não deixa espaço para a pureza ou a mínima réstea de ingenuidade. Quanto mais perto se encontram mais fundo se agridem. Os diálogos são cortantes e os actores são brilhantes nesse jogo do faz-de-conta que é a representação. Sendo injusto destacar algum, Clive Owen merece especial referência pela forma como combina a técnica com o olhar e a voz. Mike Nichols brilha com a adequada encenação minimalista que potencia o mérito das verdadeiras vedetas (texto e actores), conseguindo aqui talvez o seu melhor filme.
Um excelente filme, que não nos deixa nada bem dispostos, mas ajuda a compreender a tortuosidade de muitas relações.
Um excelente filme, que não nos deixa nada bem dispostos, mas ajuda a compreender a tortuosidade de muitas relações.
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